Fotografia de autoria desconhecida
Foi
num voo Marabá-Brasília.
O
comandante dizia o de sempre. E em duas línguas. Texto mais que conhecido pra
quem ultimamente elegera manter os pés mais tempo nas nuvens do que em terra
firme.
Enquanto
isso pessoas de pele bem morena, cabelos lisos e pretos, procuravam seus
assentos. Vinham de shorts mostrando o elástico da calcinha, de chapéu de
vaqueiro, relógio tipo rolex e mochila parecida com aquelas da Company. Mistura
desregrada que certamente deixariam os que costumam viajar de Ray ban, Galaxy
SIII e bolsa Louis Vuitton de cabelos em pé.
Não
havia desconforto daqueles em ali estarem. O incômodo era meu mesmo.
Tinha
acabado de ler um belo conto de Mia Couto no qual a seguinte frase me esfaqueara:
“A pessoa viaja é pra ser esperado”.
Eu
não. Esse luxo nunca tive. Nem nunca esperei por ele.
Mas
nem era sobre isso que queria falar...
A
vontade de escrever veio mesmo após o comissário de bordo dizer um par de
coisas que foram traduzidas em três línguas. Incluindo o japonês.
Ri
alto.
Olhei
para o lado e o senhor de mochila mirava calmamente seu relógio de pulso,
enquanto acomodava seu chapéu sobre o rosto, sem despregar os olhos das nuvens
pelo quadradinho da janela.
Em
quê pensava?
Haveria
tradução possível que o desviasse de si próprio? Haveria alguém esperando por
ele lá embaixo?
Seja
como for, eu já o aguardava. Na verdade mais que isso: fitava-o acompanhando
seu ensimesmamento de homem simples.
Em
qual idioma seria possível falar com ele senão reverenciando sua poética por
meio dessas parcas linhas?
P.S:
ele escolheu beber coca zero e pareceu gostar do polenguinho sabor gorgonzola.
Enquanto eu reparava bestamente na pronúncia da aeromoça que, de novo em duas
línguas, dizia ser proibido um montão de coisas. Mas não entre elas, viajar
para além da rota traçada para aquele avião.