domingo, 11 de novembro de 2012

(in) tenso

Robert Doisneau, fotógrafo francês


Ainda bem que meu corpo que sua, fede e escorre, me lembra, sábio, que é preciso que eu me renove. Nem que seja só no banheiro.

Continuar amando quem te abandona é o amor mais puro que conheço. Deve ser por isso que sempre suspeitei que masoquismo pudesse ser amor dos bons disfarçado de doença. Pôr à prova diagnósticos com crivo de um CRM respeitado é tão difícil quanto fazer crer que receita verdadeira de vida se faz é com restos. Com o que se tem em mãos mesmo.

Restos de esmalte vermelho nas unhas se tira com acetona. E restos de gente na alma, se tira com o quê?

Porque às vezes ou quase todas as vezes, não há tempo disponível para se fazer listas de compras, para enfrentar filas intermináveis. Porque há certos “sins” que são pra ontem eprontoacabou. Por isso enfrento vazios para oportunizar encontros, mesmo que o amor tenha virado verbo sem sujeito composto. Daí a tentativa de encontrar felicidade no inesperado que desponta toda hora durante esse processo inútil da espera do algo (a abominável coisa para a qual atribuímos mais valor que a nós mesmos) que nos redima da morte, da solidão e da dor.

Indeterminando-me por instantes (infinitos, meu Deus!), personalizo-me. Ganho luz. Tudo pra não me assujeitar a individualidades que, admitamos de uma vez por todas, estão mais perdidas que cego em tiroteio.

Poetizando-me resisto à espera da ruptura desse silêncio que diz tanto, de forma enviesada, interpretada fraternalmente por amigos que escondem chaves de carro pra evitar que se perca a dignidade. Mal sabendo eles que nem precisamos delas pra estar lá. Ao lado daquilo que não se tem, mas se deseja.

Preciso mesmo de transporte é para tirar férias de mim.

Dias cinzas sem amor doem menos ou mais?

Ansiedade, dizem, já é sobrenome de mulher. Batismo consagrado no ultrassom que, sem censura, identifica a vagina oca, infinitamente preenchível de sonhos e desejos, diferentemente do senso comum que sentencia ser apenas a falta de falos.

É possível sentir falta de algo que nunca se teve?

_ Não é ansiedade não, my darling. É fome de vida diária porque três vezes por semana em jejum tá sendo insuficiente, me entende?

_ Então porque você não troca o medicamento? De repente pode funcionar.

_ Não! Vou trocar é de médico! 

Ah... E que conste em ata que já agendei uma visita do técnico da Sky pra próxima terça. Parece que ver TV, às vezes, salva. Só não sei ainda do quê.