Pierre Matter, escultor francês
Precisava de um computador e
internet pra trabalhar. Um básico, sem o qual não conseguiria sair do lugar.
Poucos meses depois percebeu que necessitava
mesmo era de um computador portátil relativamente leve que coubesse em bolsas,
mochilas ou sacolas (sem precisão daquela cerimônia mortuária pra guardar cabos
num lugar, computador noutro....) e uma boa conexão de internet.
Avançando um pouco mais notou que
tinha necessidade de relativo silêncio (tudo bem se os pinschers da vizinha vez
ou outra se engalfinhassem), luz amarela fluorescente e pés aquecidos (por
meias comuns, no início, mas mais adiante, por sapatinhos de lã que também
existiam pra adultos, naquela lojinha do Beco da Tecla, e que a deixavam verdadeiramente
mais feliz).
Superadas essas etapas, vinham
outras cujas sutilezas a deixavam, vez por outra, estupefata: o cactus ficaria melhor no lugar daquele
banco que, na verdade, precisava mesmo era ficar próximo ao sofazinho para que houvesse
lugar onde apoiar xícaras, copos, lanchinhos, enquanto trabalhasse.
Dito assim parecia que uma coisa
desencadeava outra, numa lógica linear e crescente, cujo resultado não poderia
ser outro senão a satisfação.
Nada disso.
Tudo isso só podia ser construído
por uma linha sutil que só a delicadeza do olhar que avalia pra salvar dá conta
de tecer. Costura necessária, diária, infinita capaz de produzir felicidade,
por exemplo, aproveitando garrafa de vidro de suco de uva pra transformá-la em
recipiente pra guardar leite na geladeira, desdobrando isso na beleza do
contentamento de ver a cor do alimento anos a fio escondido pelas embalagens
tetra pak.
Mas o silêncio que afirmava
precisar também tinha que vir de dentro. E assumiu que, antes, urgia descobrir
o que teria que comprar, buscar, superar, esquecer... ou, ao que teria que se
dedicar. A parada aí sempre era longa e trazia, obviamente, uma série de
aprendizados e, junto com eles, uma lista de coisas que precisava providenciar,
fazer, cuidar, reler, descartar...
Da luz amarela fluorescente
retirava um pouco de calor nos intermináveis dias frios de sua cidade, a
despeito de não convencer muito que isso efetivamente aquecia. Mesmo insistindo
na argumentação de que a branca remetia a hospitais e que casa tinha que ter
mais jeito de ninho que de consultório de dentista.
Quanto aos pés aquecidos, gostou
de verdade da felicidadezinha que sentiu ao ver amarrada à etiqueta de uma
blusa um envelopezinho feito de papel manteiga e, dentro dele, um botão e um
pedaço significativo de linha branca. Se o botão se soltaria ou não da prenda
de roupa comprada, pouco importava. E não importava não porque isso fosse irrelevante
(aliás, quando o tema é roupa sem botão na hora de sair, todo mundo sabe bem a
chateação que é), mas porque esse detalhezinho lhe abria outras tantas
possibilidades: a de pensar em consertar suas próprias roupas (mais ainda, de
ficar atenta se elas precisavam ser reparadas), a de guardar esse botão em um
lugar no qual, quando realmente precisasse, dele se lembraria...
Quantos aos pés, eles continuavam
gelados, mesmo depois das duas meias que pusera. Mas se sentia deveras aquecida
por se dar conta que havia outros seres espalhados por aí que lidavam com
coisas cotidianas de um jeito mais humano. Por ora, isso era suficiente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário